Iniciativas do PAC e do Plano Nacional de Ferrovias pretendem efetivamente tirar do papel projetos que beneficiem o transporte sobre trilhos, superando as já conhecidas barreira do modal. Thiago Valiati, sócio do escritório Razuk Barreto Valiati, destaca que o investimento em ferrovias possui o potencial de reduzir os custos logísticos da economia
O Brasil está avançando na discussão sobre os investimentos em ferrovias. No início de julho, o país firmou um memorando de entendimentos com a China para construir um corredor bioceânico, ligando o Brasil ao Oceano Pacífico, no Peru. A isso se acrescentam a carteira Ferrovias do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que prevê 39 empreendimentos com investimentos de R$ 91,3 bilhões, e o Plano Nacional de Ferrovias, lançado em junho, que prevê o aporte de R$ 138,6 bilhões em 15 ativos e 19 mil quilômetros de extensão de trilhos.
Este movimento do governo brasileiro visa reduzir a dependência das rodovias na matriz de transportes. A maior parte dos deslocamentos de carga do Brasil – cerca de 65% — é realizada via rodovias, de acordo com o Plano Nacional de Logística (PNL). Estima-se que as ferrovias respondam por 15% do total. Conforme a Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários, em 2024, foram registradas 150 milhões de toneladas úteis (TU) transportadas no período, o que significa um recorde dentro do recorte de 19 anos.
“Somente atrás do modal rodoviário, o setor de ferrovias ocupa o segundo lugar em volume de cargas transportada no país. Apesar disso, a participação do modal na matriz de transportes do país já foi maior em outros períodos, sobretudo até a década de 1930, em um período em que as rodovias ainda não eram tão predominantes. Em que pese o transporte ferroviário seja o mais seguro dos transportes terrestres e o mais indicado para o transporte de cargas pesadas, o modal ainda é muito subaproveitado, sobretudo em face da demasiada extensão territorial do Brasil”, destaca Thiago Priess Valiati, doutor em direito administrativo pela Universidade de São Paulo (USP) e sócio do escritório Razuk Barreto Valiati (www.razuk.adv.br).
Uma das esperanças, portanto, do Ministério dos Transportes é diversificar a atuação do governo. Um dos caminhos previstos no plano é a concessão de cerca de 4,7 mil quilômetros de ferrovias à iniciativa privada por meio de seis leilões até 2027. “O setor de ferrovias tem apresentado um renascimento nos últimos anos e consta como prioridade de novos investimentos do governo federal, inclusive em malhas ferroviárias já concedidas, como é o caso das renovações antecipadas de ferrovias, realizadas nos termos da Lei nº 13.448/2017, e diante da edição de um novo marco regulatório para o setor, a Lei nº 14.273/2021, destaca Valiati, que atua e possui experiência na área de Direito de Infraestrutura e Regulatório.

Uma demanda por soluções complexas
As dificuldades do país para expandir a disponibilidade de ferrovias funcionais já são conhecidas. Há um consenso, porém, de que os aportes de recurso neste setor reduziriam os custos logísticos de muitas operações. Para isso, é preciso atacar diversas frentes, a começar pela infraestrutura defasada, que se reverte na falta de padronização de bitolas em todo o país e locomotivas e vagões obsoletos, exigindo revitalizações e reformas em toda a malha já existente. O foco está em assegurar uma integração multimodal, especialmente com portos e rodovias relevantes do país.
Um segundo ponto envolve a dificuldade regulatória. As concessões e autorizações costumam ter trâmites longos e, em muitos casos, esbarram em dificuldades técnicas, operacionais e ambientais. “Este, talvez, consista no principal desafio para o efetivo incremento do modal ferroviário no país. Os entraves regulatórios acabam atrasando e interferindo demasiadamente para que essas iniciativas efetivamente saiam do papel, impactando na tomada de decisão de potenciais investidores, principalmente estrangeiros”, afirma o advogado.
Valiati, por sua vez, destaca que “a Lei nº 14.273/2021, novo marco regulatório do setor, inovou completamente o setor de ferrovias. Com o objetivo de estimular investimentos no setor ferroviário e aumentar a competitividade e a participação do modal na economia nacional, o marco regulatório altera a sistemática da exploração das ferrovias nacionais, sobretudo em relação à exploração das ferrovias pela iniciativa privada”.

Thiago Valiati ainda reforça que as ferrovias geram vantagens sob a perspectiva ambiental e de sustentabilidade, essencial dentro de uma perspectiva de descarbonização. “Em um momento de transição energética, o Brasil pode aproveitar esta discussão para diminuir a participação do modal rodoviário no transporte de cargas, sobretudo porque as ferrovias são mais eficientes, baratas e sustentáveis, gerando um impacto menor e reduzindo a quantidade de caminhões em deslocamento pelas principais estradas do país, o que também gera economia de custos para o setor produtivo”, completa Valiati.





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