29 de março de 2024

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Por Ana Perugini

 

Quando penso nos desafios vividos pelas mulheres no dia a dia, me recordo de “Maria Maria”, de Milton Nascimento. A canção que foi consagrada na voz de Elis Regina retrata a vida de uma mulher cheia de garra, que não desanima em meio às dificuldades e tem muita fé na vida para alcançar seus objetivos.

E é assim que vejo cada mulher que encontro nessa caminhada. Me surpreendo com histórias de superação, acolhimento, solidariedade e, também, com a determinação para garantir espaço em ambientes tão difíceis e, por vezes, machista.

Ser mulher no Brasil não é fácil. E ser mulher na política é ainda mais complicado. Prefeituras, câmaras, Congresso, Senado, ministérios são espaços ocupados, em sua maioria, por homens, onde o machismo, infelizmente, continua prevalecendo.

Por maiores que sejam nosso grau de instrução e nosso conhecimento sobre a área em que atuamos, temos que provar competência o tempo todo para ganhar o respeito das pessoas.

Há algumas semanas, durante sessão da CPI da Pandemia, o ministro da CGU (Controladoria-Geral da União) – Wagner Rosário, chamou a senadora Simone Tebet de descontrolada ao ser questionado sobre a fiscalização do contrato da vacina Covaxin. Simone é advogada, professora, escritora e sentiu na pele o que muitas de nós vivemos na convivência com homens. O preconceito está presente em muitas palavras e atitudes, infelizmente.

Nos espaços de poder, a violência psicológica produz na vítima o sentimento de humilhação, fazendo com que ela se sinta incapaz e despreparada para o ofício ao qual se propôs a exercer. É como se o agressor dissesse: “você não deveria estar aqui”.

Outro caso de violência contra mulheres em cargos públicos ocorreu no norte do nosso país. Em Oriximiná, município localizado no oeste do Pará, o prefeito William Fonseca é acusado de espalhar boatos na cidade de 74 mil habitantes sobre a vida sexual de três vereadoras de oposição. Os ataques ocorreram após elas votarem a favor da abertura de um processo de cassação que apura a contratação excessiva de funcionários.

A tática, nesse caso, é desqualificar as denunciantes a partir de um julgamento moral por parte da população. Colocá-las em “praça pública”, atribuindo a elas relacionamentos extraconjugais, para serem “apedrejadas” e descredenciadas ao exercício do cargo para o qual foram eleitas legitimamente. Isso é violência política e difamação.

O machismo é patológico, não tem vergonha nem limites. Em dezembro do ano passado, a Assembleia Legislativa de São Paulo transmitiu ao vivo o momento em que o deputado Fernando Cury passou a mão no seio da parlamentar Isa Penna, em pleno plenário, durante a votação do orçamento do estado para 2021. Num acordo entre cavalheiros, a importunação sexual foi resumida a apenas 180 dias de suspensão do mandado de Cury, que poderá voltar a legislar em outubro, como se nada tivesse acontecido.

Se o machismo dá guarida a ataques como o flagrado no Parlamento paulista, é inacreditável o que acontece com as mulheres nos bastidores da política brasileira. Quem não se lembra de quando o então deputado Jair Bolsonaro disse que não estupraria a deputada Maria do Rosário porque ela não merecia, por ser “muito feia”? Diante dessa afirmação, cabe a pergunta: alguém merece ser vítima de tamanha brutalidade?

Quando a violência contra a mulher não é combatida, seja no ambiente doméstico, político ou corporativo, pode evoluir ao último estágio, que é o assassinato. O feminicídio político da vereadora Marielle Franco, cometido em março de 2018, no Rio de Janeiro, e ainda sem solução, é um exemplo do ápice da violência política contra mulheres.

Diante de um quadro tão complexo, é preciso ter “força, é preciso ter raça, é preciso ter gana, sempre!”. Somos mais da metade da população e precisamos continuar lutando para que essa representatividade se faça em todos os espaços de poder, inclusive na política.

Uma grande aliada nessa luta é a Procuradoria Especial da Mulher (que, inclusive, foi determinante no caso do Pará) em funcionamento em câmaras municipais e assembleias legislativas, um instrumento pelo qual lutamos no Congresso Nacional, quando presidimos a Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher e coordenamos a Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Direitos Humanos das Mulheres no Congresso Nacional.

Apesar de tantas adversidades, seguimos lutando por uma sociedade em que a capacidade e a competência não sejam mensuradas de acordo com a cor da pele, sexo, origem, idade ou religião.

Ana Perugini é funcionária pública do TJ-SP, com formação em direito pela PUC-Campinas e pós-graduação em gestão pública pela FGV/Perseu Abramo. Mãe de três meninas, foi vereadora, deputada estadual e federal, quando presidiu a Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher. É autora do projeto que cria o PIB da Vassoura

 

(Os comentários são de responsabilidade do autor, e não correspondem à opinião do SB24Horas)
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