Apesar das críticas de evangélicos e católicos, a presidente Dilma Rousseff (PT) sancionou, sem vetos, a lei que estabelece garantias à mulher vítima de violência sexual, incluindo a oferta da pílula de emergência e de informação sobre seus direitos ao aborto em caso de gravidez.
A informação foi confirmada pelos ministros Alexandre Padilha (Saúde), Eleonora Menicucci (Mulheres) e Gilberto Carvalho (Secretaria-Geral da Presidência) em entrevista coletiva nesta quinta-feira (1º). A presidente vai enviar nesta sexta-feira (2) projeto de lei cujo objetivo é uniformizar as redações de instruções do Ministério da Saúde e do código penal. A sanção também será publicada no “Diário Oficial da União”.
Como aprovado pelo Congresso Nacional, a lei estabelece garantias para que a mulher seja prontamente atendida na rede pública de saúde nos casos de violência sexual. Determina, por exemplo, a oferta da pílula de emergência (chamada no texto de “profilaxia da gravidez”) à vítima e de informações sobre os direitos previstos nestes casos –uma referência à necessidade de informar à mulher o direito ao aborto legal em caso de gravidez decorrente do estupro.
Esses pontos foram objeto de muitas críticas feitas por evangélicos e católicos, que veem na lei uma possibilidade de abertura ao aborto, para além dos casos que ocorrem hoje. Os grupos rejeitam, por exemplo, a utilização do termo “profilaxia da gravidez”, argumentando que a gestação não é uma doença que deva ser evitada.
No entanto, esses mesmos pontos da lei já constam de norma técnica do Ministério da Saúde, atualizada em 2012, e de protocolos dos hospitais que atendem às mulheres vítimas de violência sexual.
O Palácio do Planalto recebeu nas últimas semanas representantes de igrejas católicas e evangélicas, que pediram veto integral ou parcial ao projeto. “Essa sanção foi precedida de uma série de diálogos e conversas e consultas a setores, tanto aqueles que pediam a sanção como aqueles que pediam o veto ou total ou parcial, sobretudo desse item que dizia da questão da profilaxia da gravidez, entendendo que aí se abriria para a prática de aborto”, disse o ministro Carvalho.
“É exatamente um projeto que além de prestar o apoio humanitária essencial à mulher que foi vítima de uma tortura, porque todo estupro é uma forma de tortura, ela permite que ela não passe por um segundo sofrimento: a prática do aborto legal”, completou o ministro.
A área técnica do governo defendeu a sanção integral da lei, apesar de não estar satisfeita com alguns trechos dela. Isso porque entende como importante o reforço, na lei, de práticas já adotadas que têm impacto na redução do número de mortes maternas (por aborto clandestino) e do aborto legal em si (nos casos em que a mulher não tem acesso à pílula de emergência e engravida após a violência).
Segundo Padilha, a ideia é oferecer “tratamento humanizado, respeitoso a qualquer vítima de estupro”. A lei também prevê tratamento psicológico ao cidadão de ambos os sexos e de qualquer idade, além de tratamento por qualquer lesão física e medidas e indicações de profilaxia de doenças sexualmente transmissíveis, como hepatites virais e HIV.
NOVO TEXTO
A saída encontrada para manter a lei e evitar conflitos foi o envio de um novo projeto de lei ao Congresso, para esclarecer pontos duvidosos ou eventualmente equivocados. Serão alterados trechos da lei 12.845, que dispõe sobre o atendimento obrigatório e integral de pessoas em situação de violência sexual.
O novo texto pretende uniformizar a recomendação do Ministério da Saúde e o que está disposto no código penal na lei. Dessa forma, a lei passaria a ter a seguinte redação: “Considera-se violência sexual todas as formas de estupro, sem prejuízo de outras condutas previstas em legislação específica”. Também será esclarecida no texto a seguinte redação sobre a profilaxia para a gravidez pós-estupro: estará assegurada à vítima “medicação com eficiência precoce para prevenir gravidez resultante de estupro”.
“É muito importante a correção dessa imprecisão: além de estar no código penal, é o que é recomendado pelo Ministério da Saúde”, completou Padilha.
A justificativa do governo, enviada ao Congresso Nacional, é que o texto aprovado pela Casa “contém algumas imprecisões técnicas que podem levar a uma interpretação equivocada de seu conteúdo e causar insegurança a respeito da aplicação das medidas previstas na lei”.
“O texto aprovado inicialmente é vago e deixa dúvidas quanto à extensão dos casos que seriam abrangidos pela lei”, continua. “A expressão ‘profilaxia da gravidez’ não é a mais adequada tecnicamente e não expressa com clareza que se trata de uma diretriz para a administração de medicamentos voltados às vítimas de estupro.”
Fonte: Folha de São Paulo