29 de março de 2024

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Sistema Cantareira sofreu transição catastrófica em 2014

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As represas do sistema Cantareira sofreram uma transição catastrófica em janeiro de 2014, quando passaram rapidamente de condições normais para um estado de ineficiência. A avaliação é baseada em dados sobre os reservatórios, métodos estatísticos e modelagem matemática, e foi feita em estudo dos pesquisadores Paulo Inácio Prado, professor do Instituto de Biociências (IB) da USP, e Renato Mendes Coutinho e Roberto Krankel, da Universidade Estadual Paulista (Unesp). De acordo com o trabalho, ações que poderiam deter a transição deveriam ter sido tomadas antes de 2014.

A pesquisa é descrita em artigo da revista científica PLoS ONE. O motor da transição é o que é chamado popularmente de “efeito esponja”. Em situação de normalidade, há muita água no reservatório e na bacia hidrográfica. Boa parte da água da chuva vai para os reservatórios, mantendo o sistema no estado normal. Isto resulta em um círculo virtuoso.

Já numa situação de seca, o volume do sistema é mais baixo e o solo absorve mais da água que iria para o reservatório, o que faz o seu nível baixar mais ainda. Neste caso, há um círculo vicioso. A passagem do círculo virtuoso ao vicioso é uma transição que acontece em poucos meses. Para evitá-la é preciso monitorar o sistema e retirar menos água quando houver o risco de transição.

O professor Prado aponta que no Cantareira a eficiência do sistema caiu muito. “Esta eficiência é a relação entre a chuva que cai e a quantidade de água que vai para os reservatórios”, ressalta. “E ela continua baixa mesmo com as chuvas voltando à normalidade, o que indica que o sistema mudou de regime”.

Sinais de transição
Outra evidência da perda de eficiência são sinais estatísticos de transição nas variações diárias de volume. “Há várias técnicas que detectam estes sinais, e eles são inequívocos para o sistema Cantareira”, aponta Prado. “Além disso, o grupo de pesquisa desenvolveu um modelo matemático para descrever a transição, que se ajusta muito bem aos dados de volume e vazões observados”. Por meio desse modelo são feitas projeções para os próximos 30 dias, publicadas diariamente no site Águas Futuras desde o último mês de abril.

Os pesquisadores estimam que a transição no Cantareira ocorreu entre novembro de 2013 e janeiro de 2014, indicada pela queda abrupta da eficiência do sistema e os sinais estatísticos de transição. Transições críticas não são novidade para cientistas, que as associam ao conceito de resiliência. Intuitivamente, resiliência é a capacidade de um sistema de voltar ao mesmo estado depois de ter sido perturbado. Alguns casos de perda de resiliência na natureza são bem estudados, como o processo de desertificação.

O trabalho mostra que a perda de resiliência também pode ocorrer em reservatórios de água, como no sistema Cantareira. “O artigo analisa o caso da Cantareira como um exemplo de biestabilidade. É um conceito da física para descrever sistemas que têm mais de um estado possível. É o caso de um barco na água, que em condições normais não vira com a ação das ondas ou do vento. Este é um estado resiliente”, explica o professor. “O problema é que se uma força grande o suficiente virar o barco, ele passa a um novo estado que também é resiliente — é preciso um grande esforço para desvirá-lo”.

De acordo com Prado, a Cantareira sofreu uma força grande o suficiente para mudar de estado, e agora resiste para voltar à condição normal. “O empurrão foi manter a retirada de água em níveis de anos normais em um ano de chuvas anormalmente baixas”, ressalta. “Não é possível controlar a chuva, mas uma redução mais precoce da retirada de água poderia ter evitado a transição”. O pesquisador propõe reduzir a retirada ao mínimo possível, e a médio prazo, se o sistema se recuperar, realizar uma gestão mais cautelosa, devido ao risco adicional de transições.

Os resultados da pesquisa mostram que o gerenciamento de um reservatório deve levar em conta a possibilidade de transições catastróficas. O padrão anteriormente utilizado, baseado na chamada “curva de aversão ao risco”, indicava uma situação de normalidade até dezembro de 2013, o que o artigo mostra que não era real. “Isto quer dizer que é necessário definir novos parâmetros de operação a partir de conhecimentos científicos atuais”, conclui Prado.

 

Agência USP de Notícias

(Os comentários são de responsabilidade do autor, e não correspondem à opinião do SB24Horas)
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