28 de março de 2024

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Escola indígena, na Amazônia, intervém na sua comunidade

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Os índios Kotiria, também conhecidos como Wanano, compreendem a escola como um bem comunitário. Lá, as decisões sobre os principais temas, como merenda, comportamento de professores, estudantes e temática das aulas, entre outros, são tratados pelas mães, pais, avós, estudantes, ex-alunos e docentes.

Entre 2011 e 2012, a pesquisadora Aline Abbonizio pôde observar a relação deste povo com a escola local. Os relatos e análises das visitas e permanências na comunidade resultaram na tese de doutorado Educação escolar indígena como inovação educacional: a escola e as aspirações de futuro das comunidades, defendida na Faculdade de Educação (FE) da USP.

Os Kotiria habitam a Terra Indígena Alto Rio Negro, na cidade de São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas. Foi lá que, em 2011, Aline passou três meses na maior comunidade Kotiria, do lado brasileiro, em Caruru Cachoeira, onde vivem 33 famílias, cerca de 160 pessoas. “Mais precisamente, as comunidades Kotiria estão no alto rio Uaupés, na fronteira do Brasil com a Colômbia”, conta a pesquisadora. “A maioria deles vive na Colômbia, no Departamento de Vaupés”. A escola do povo Kotiria é pública, municipal e indígena. À época das visitas de Aline, contava com cerca de 110 estudantes no ensino fundamental e 17 no ensino médio. Em São Gabriel quase 90% da população é indígena. Aline conta que a construção da primeira escola de Caruru Cachoeira ocorreu na década de 1960 e, como toda escolarização disponível naquela região, era gerida por religiosos católicos da ordem dos salesianos.

Em 2012, a pesquisadora esteve em São Gabriel mais duas vezes. “Na primeira, fiquei apenas na sede urbana do município e entrevistei gestores das secretarias municipal e estadual de educação, e líderes da maior associação indígena da região, a Foirn, Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro”, relata. No mesmo ano, retornou a Caruru Cachoeira e lá permaneceu por mais um mês, onde conheceu outras comunidades Kotiria mais ou menos próximas de Caruru.

Contrapartida

Escola mantém roça e, com sua produção, prepara os próprios alimentos

A permanência de Aline na comunidade, onde fez a coleta de informações para a pesquisa, teve como contrapartida a solicitação para que apoiasse as ações da escola, de docentes e estudantes, que foram chamadas de assessoria pedagógica. “A convivência e o trabalho junto àquela população me permitiu perceber a escola como centro de reflexão e intervenção sobre as condições de vida comunitária”, descreve. “Pensar sobre o que deve ser feito para melhorar a escola está estreitamente relacionado com o que deve ser feito para melhorar a comunidade. Neste caso, os Kotiria têm uma escola que intervém diretamente sobre suas condições de vida”.

Outro aspecto importante é a alimentação escolar. A escola mantém uma roça de mandioca e, com sua produção, prepara alimentos como farinha, beiju e caxiri, uma bebida fermentada. Para tanto, conta com o apoio e os ensinamentos das mães, pais e avós. Além disso, os Kotiria estão muito interessados em conhecer outras e novas técnicas de cultivo, tanto para resolver o problema da escassez sazonal de alimentos como para obterem algum excedente de sua produção e gerar renda.

Inquietação
Graduada em História, Aline trabalhou por um bom período com educação popular, de jovens e adultos pouco escolarizados. No mestrado em Educação, pesquisou um programa municipal voltado à educação popular, o Movimento de alfabetização de jovens e adultos de São Paulo (MOVA-SP). “Nesta trajetória, inquietava-me a costumeira desconexão entre escolarização e intervenção direta sobre condições de vida, sobre a melhoria da situação das pessoas envolvidas no processo de escolarização.”

Em 2007, passou a trabalhar com o professor Elie Ghanem, da FE, seu orientador no doutorado. “Ele vinha pesquisando iniciativas que atrelavam educação não-escolar a desenvolvimento local. Me identifiquei com a temática e fui percebendo que no âmbito propriamente escolar, das escolas públicas, eram raras as iniciativas que atrelavam ao fazer educacional a intervenção direta sobre a economia local”, conta. Foi quando Aline, já no doutorado, soube de algumas escolas de São Gabriel da Cachoeira apontando, justamente, para a proximidade entre objetivos escolares, ou seja, a definição de temas de estudo, de rotinas e de práticas, com as necessidades e demandas comunitárias.

Imagens: Divulgação

Agência USP de Notícias

(Os comentários são de responsabilidade do autor, e não correspondem à opinião do SB24Horas)
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